quarta-feira, 28 de junho de 2017

HIV/AIDS - CONFISSÃO #16: O HIV ESTAVA SE TORNANDO MEU MENOR PROBLEMA

PARTE 39 - EU NÃO SEI
Eu sou do tipo que tem ressaca moral. Que após uma festa sempre fica pensando se passou dos limites ou fez algo que poderia se arrepender. Depois desta última festa eu estava assim. Pensando sobre minhas atitudes. Sobre misturar remédios com bebida. Chamar a atenção. Essas coisas. Sobre os atos de meus amigos. Sobre o que eles me falaram. Nessas horas que consigo refletir melhor. Por isso normalmente após festas, não costumo sair. Fico em casa colocando os pensamentos em ordem.
Esse momento reflexivo é um perfeito momento para conversas e debates. É quando estou mais sensível e consigo ver um pouco além do que costumo. Por outro lado, é também um momento que posso me abrir de mais, falar de mais e me arrepender.
Justamente num momento como esse que resolvi atender um chamado de mensagem do Facebook de uma amiga. Ela estava passando por um momento ruim e precisava desabafar. Eu fui todo ouvidos. Para mostrar para ela que todos temos nossos problemas, contei para ela sobre minha sorologia. Segundo ela, esse fato não era novidade, já tinha escutado murmurinhos sobre o assunto.
Ela me fez uma pergunta que todos costumam fazer: “sabe de quem você pegou?”. Minha resposta foi a mesma de sempre: “Não”. De fato, até hoje não sei como contraí o vírus. Ela refez a pergunta: “não lembra de nenhuma situação de risco?”. Eu me senti confortável para responder, já que estávamos em um clima de confissões mútuas. Então contei que no início de 2013, por duas vezes no intervalo de uma semana, durante o ato sexual eu tive camisinhas estouradas e só percebi no final. Essas duas vezes com a mesma pessoa.
Pode parecer óbvio para muitos. “Então claro que você pegou do fulano”. Não. Eu nunca diria isso. A única coisa que falei, em um momento de desabafo era que tive duas situações de risco com a mesma pessoa. Esse menino, do qual eu era apaixonado, já não morava na cidade. Segundo essa minha amiga, ele teria saído da cidade por descobrir ser portador do HIV. Claro que depois dessa afirmação dela eu concluí: “bom, se é assim, tudo se encaixa”. Mas ainda sim reforcei dizendo que não tínhamos como afirmar nada.... Eu poderia ter transmitido pra ele. Eu poderia ter adquirido em um sexo oral, do qual infelizmente e de forma imprudente praticamente ninguém usa camisinha. Eu poderia ter pego de um ex-namorado. Ou seja, seria leviano demais da minha parte dizer que esse menino é portador do HIV ou pior, que ele foi o meu transmissor.
PARTE 40 - MINHA CULPA
Claro que nossa conversa deveria ter morrido entre nós. É o que se espera entre amigos. Poucos dias eu recebi uma mensagem também via Facebook. Era ele. Dia 10 de outubro de 2014.
“Que historia é essa que tu anda espalhando? Que tu anda dizendo que tá com aids e que eu que te passei. Acabaram de me ligar me dizendo isso. Que tu tava espalhando pra todo Uruguaiana isso. E que tava fazendo tratamento no SUS.”
Eu fiquei em choque. Por vários motivos. O primeiro era que tudo o que eu tinha dito tinha sido distorcido propositalmente. Segundo, era que quem tinha feito a fofoca toda seria supostamente uma amiga, que eu justamente estava ajudando a sair de uma fase ruim. Terceiro, fiquei muito chateado por ser algo muito sério, passível de problemas judiciais, com uma pessoa da qual eu gostava muito.
Tentei explicar, tentei justificar, tentei argumentar. Recebi isso:
“Pois é Leonardo.. já te falei e repito, não quero meu nome nesses teus xismes .. ou isso vai parar na justiça.”
No fim, a história acabou nessas mensagens mesmo. Outro dia enquanto cruzava por ele na rua em uma de suas passagem pela cidade ele me ignorou completamente. Poucos meses depois eu tive a confirmação de que ele realmente não tem HIV. E digo, fico muito feliz por ele por isso.
Depois de nossa conversa, fiquei desolado por alguns dias. Pensei em ir até essa menina que tinha aberto sobre minha confissão e tomar satisfação, mas pensei que não valia. Não valia a preocupação, o desgaste... e principalmente levar adiante essa história que estava tomando uma proporção gigante. Várias vezes após isso, quando me abri para determinado amigo eu escutava a pergunta se eu tinha realmente pego do fulano. Bom, se ele não espalhou, se eu não espalhei, não me restava muitas dúvidas de onde teria saído o boato.
Isso me fez repensar muito sobre quem são meus amigos e quem são meus conhecidos. Sobre se abrir esperando honestidade. Infelizmente nem todas as pessoas não são assim. Não consigo até hoje compreender a motivação que a levou a iniciar essa fofoca ou o que de fato ela ganhou com isso. Aliás, tento entender como ela olha nos meus olhos e sorri frequentemente. Não consigo.
Entendi que o meu problema na verdade, nem era mais o HIV. Meu problema eram as pessoas que estavam me rodeando. O vírus me fez perceber isso. Separar o joio do trigo, além de aprender a lidar com elas.
E sobre quem me passou... Se eu tenho curiosidade? Honestamente não. Isso não faz mais diferença. Agora tenho que olhar pra frente. Tenho que cuidar da minha saúde, não temos como voltar no tempo. De nada adiantaria me remoer e me culpar... Muito menos tentar achar um culpado. É tudo uma questão de ação e consequência.
Eu assumo a culpa. Eu fui o responsável. Eu não me cuidei. Eu sabia dos riscos. Eu aceito isso e olho pra frente. Apenas para frente.

Continua...

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