quarta-feira, 12 de julho de 2017

HIV/AIDS - CONFISSÃO #25: JÁ RECEBI OFENSAS ANÔNIMAS

PARTE 56 - TATUAGEM
Eu já vinha deixando pistas. Já vinha escrevendo muito sobre HIV/AIDS. Estava compartilhando vídeos, postagens, notícias sobre o vírus e muita informação. Muitas pessoas já percebiam por onde eu vinha. Outros ficaram em dúvida. Isso ficou claro quando eu abria sobre minha sorologia para outros. “Eu desconfiei”, me diziam. Claro que na comunidade LGBT isso não era mais segredo, acho que nunca foi. Muitos quando falavam comigo diziam, “capaz, nem imaginava”.... Mas depois eu descobria que eles já sabiam. Não queriam me constranger, suponho.
Eu cheguei a fazer uma tatuagem que indicava isso e passou despercebido. Eu explico. Em agosto de 2015 eu vi um vídeo da famosa YouTuber Jout Jout Prazer, chamado “Uma Aula”, no qual ela tem uma esclarecedora conversa com o soropositivo Gabriel. Com seu característico humor inteligente, ela fala tudo aquilo que sempre estamos tentando conscientizar, sobre a vida normal de um portador do HIV e sua possibilidade de um relacionamento amoroso/humano normal, como qualquer outra pessoa. Mas, dentro do vídeo, o rapaz mostrou uma tatuagem de uma ampulheta. Sua explicação é tão genial que eu só pensei: “como nunca pensei nisso antes”. Então eu dentre minhas 23 tatuagens, tive minha primeira inteiramente copiada. Mas acontece que a ideia era tão perfeitamente identificável comigo, como deve ser com tantos soropositivos, que não me senti um plagiador. Esse tipo de ideia tem que copiar mesmo.

Segundo Gabriel, quando ele vai fazer seus exames de rotina e tiver seu sangue retirado, o enfermeiro enxerga o desenho com as areias terminando, mas ele, olhando por outra perspectiva, vê com as areias apenas começando. Não é genial? Como não pensei nisso antes. Para não ficar completamente igual, fiz também uma ampulheta, mas no lugar a areia coloquei sangue.


Cada um vê a vida como sua realidade permite.

PARTE 57 - O ANÔNIMO
Ser soropositivo já estava sendo um ato de luta. Minha aceitação com minha sorologia estava me deixando muito seguro sobre mim e sobre falar naturalmente sobre isso. Tive mais certeza sobre isso quando recebi mensagens anônimas em meu perfil do Facebook no início de 2016. Nunca pensei que receberia tantas ofensas de uma única pessoa de uma só vez.
Numa noite de sábado, das quais eu frequentemente passava todo o tempo vendo filmes, recebi uma mensagem de um perfil falso. A primeira já ofendia minha condição sexual. Mas eu não procurei rebater as ofensas e me mantive calmo. Isso fez as ofensas partirem para um outro nível, ainda mais baixo. De repente eu li: “seu viado sujo, todo mundo sabe que você é podre e tem aids.”
Bom. Nesse momento eu fiquei tentando identificar quem poderia ter tanto ódio de mim pra chegar a nesse ponto. Um ex-namorado? Alguém da confusão durante a votação do PME? Quem teria tamanha falta de humanidade? Não sei. O que sei é que li absurdos, poderia citar alguns para podermos mensurar: “seu imundo criminoso que sai por aí passando aids pra todo mundo, deveria ser peso”, “quando tu morrer as pessoas não vão poder nem chegar no teu caixão para não se contaminar”, “não tem vergonha de ser uma bicha suja e doente?”, ou ainda, “tenho pena de você que vai morrer sofrendo, logo, logo”.
Eu deixei ele falar o que queria. Digo ele, pelo fato da pessoa ter se identificado como ele. Depois só respondi que eu mesmo falava sobre minha sorologia praticamente abertamente. Como não dei muito crédito, ele cansou e foi embora. Logo depois excluiu seu perfil. É bem provável que ele tenha feito um conta apenas para me ofender. Fico pensando o quanto isso poderia ter me machucado se eu não me aceitasse ou se fosse mais no início da descoberta de minha sorologia. As pessoas infelizmente passam dos limites.
Depois disso, precisava ter uma conversa decisiva com minha família.

Continua...

Obs.: existe uma lei que pune a discriminação com portadores do HIV e os doentes de aids. A lei 12.984, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, no dia 02 de junho de 2014. Conheça:
Art. 1o Constitui crime punível com reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, as seguintes condutas discriminatórias contra o portador do HIV e o doente de aids, em razão da sua condição de portador ou de doente:
I - recusar, procrastinar, cancelar ou segregar a inscrição ou impedir que permaneça como aluno em creche ou estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado;
II - negar emprego ou trabalho;
III - exonerar ou demitir de seu cargo ou emprego;
IV - segregar no ambiente de trabalho ou escolar;
V - divulgar a condição do portador do HIV ou de doente de aids, com intuito de ofender-lhe a dignidade;
VI - recusar ou retardar atendimento de saúde.
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

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